A Tia Miséria (recolhido blog -adversus omnes)
Havia
no princípio do mundo uma velhinha muito pobre e muito infeliz: era
conhecida pela Tia Miséria. Só possuía uma casinha arruinada e uma
pereira defronte da porta. Tudo sofria com paciência e resignação, mas
só uma coisa não desculpava, nem perdoava: que os garotos subissem à
pereira e lhe comessem as pêras. Era capaz de dá-las todas sem provar
uma, mas indignava-se contra os que lhas roubavam.
Uma noite
bateu-lhe à porta um pobrezinho; correu a abri-la e deu ao pobrezinho a
migalha de pão que reservava para si. No dia seguinte despediu-se o
pobre e disse-lhe que pedisse o que quisesse.
Só peço que as pessoas que subirem à minha pereira não possam descer sem o meu consentimento – respondeu a velhinha.
- Assim será – respondeu o mendigo.
No outro dia, quando saiu à rua, encontrou três garotos em cima da pereira.
- Ó Tia Miséria, perdoe-nos pelo amor de Deus! Tire-nos daqui, não podemos descer.
- Ah! Pois vocês diziam que não eram os ladrões das minhas pêras! Por esta vez, vá; Se lá voltarem hão-de ficar aí muitos anos.
E os garotos desceram e não mais voltaram à pereira.
Um dia de
manhã, entrou-lhe em casa uma mulher de horrendo aspecto, vestida de
negro e armada de foice, com as asas negras nos ombros e nos pés.
- O que me quer? - Perguntou a Miséria a tremer.
- Sou a Morte: venho buscar-te.
- Já? Pois nem ao menos me dá um ano de espera?
- Não pode ser - respondeu a Morte.
- Faça-me ao menos um favor: suba à minha pereira e colha-me a última pêra que me resta. Quero comê-la, visto que é a última.
A Morte subiu à
pereira, colheu a pêra, mas não pôde descer. Pôs-se a chamar a
velhinha. Esta respondeu: “Tem paciência, aí ficarás para todos os
séculos. És má, tens feito muitas desgraças, roubando muitos pais aos
seus filhos pequeninos...”
E a Morte ficou em cima da pereira.
Passados dias
tinha a velhinha em frente da sua porta um exército, composto de padres
que se queixavam de que não havia enterros, de escrivães que se
lastimavam de não ter inventários, de delegados que se doíam de não
fazer promoções orfanológicas, de juízes que se queixavam de não receber
emolumentos das reuniões dos conselhos de família, das presidências nos
actos de licitações e das sentenças em demarcações, enfim, de todos
aqueles indivíduos que vivem da morte do próximo. Todos pediam à
velhinha que autorizasse a Morte a descer da pereira, mas a velhinha
respondia: “ Não quero, não quero e não quero”.
Falou então a
Morte do alto da pereira e fez com a velhinha um contrato: poupar-lhe a
vida enquanto o mundo fosse mundo. A velhinha consentiu e a Morte
desceu. Por isso enquanto o mundo for mundo a Miséria existirá sobre a
Terra.
Olá,
ResponderExcluirJá estamos em março, e até agora não vi em nehum lugar o resultado do Concurso Contos do Tijuco, no qual participei o ano passado.
Alguém tem alguma informação?
Agradeço.